Das escolhas da maternidade – quando destino acerta

Quando engravidei eu vivia uma fase intensa da minha vida. Estava no quarto ano da graduação (me formaria em cinco), de um curso integral, extremamente exigente, incompatível com maternidade. Meu marido, namorado na época, tinha começado o doutorado e estava com uma viagem marcada para ficar um ano fora do país.

A gravidez foi totalmente inesperada. Passado o susto inicial, na décima primeira semana da gestação o segundo susto: eram gêmeos. Meus filhos que me perdoem se um dia lerem isso, mas aquele dia eu me senti a pessoa mais azarada do mundo!

A vida mudou de repente. Com muito apoio da nossa família, financeiramente inclusive, começamos a organizar o que precisava pra gente se casar, montar um lar e esperar os bebes chegarem. Mas, antes que eu pudesse fazer isso tudo com tranquilidade e começar a curtir a gestação, todas as mudanças que estavam acontecendo com meu corpo e minha vida, outro susto: os meninos nasceram, prematuros extremos, com 29 semanas de gestação. Tivemos que enfrentar sessenta longos dias de uti neo, todos o pacote de intervenções e intercorrências que os bebês tiveram e de brinde uma lesão cerebral em cada um, que gerou sequelas motoras. Se você acha que um filho muda a vida, dois com paralisia cerebral muda muito mais, garanto!

Esse texto é pra falar sobre carreira, escolhas e maternidade. Como é que é? Carreira? HAHAHAHAHA isso não te pertence mais Laura! Acho que já deu pra perceberem né ?!

Pois é, foi exatamente isso que aconteceu. No início da gravidez, embora eu tenha ficado desesperara, afinal filhos não estava nos meus planos e eu gostava da minha vida de universitária (inclusive da parte de ter que estudar e me dedicar muito ao curso), eu me acalmei e imaginei que fosse dar tudo certo. Imaginei que as crianças iriam nascer, com 6 meses iriam pro berçário e eu terminaria a graduação. No pior dos cenários eu atrasaria 6 meses, 1 ano a formatura.

Mas… eu simplesmente não consegui voltar! E foi aí que se instalou na minha vida uma crise enorme. Eu não queria não poder voltar. Eu não queria largar tudo e ficar em casa o tempo todo me dedicando somente aos meninos. O problema não era eles (eu os amava incondicionalmente ), nem sentir falta da vida antiga que eu tinha, mas a tristeza de saber que eu tinha já estudado tanto, faltava tão pouco pra eu ter minha profissão, e eu não podia terminar aquilo. Nadei, nadei e morri na praia. Não dava, era incompatível. Meus filhos precisavam de mim, eu tinha que cuidar deles e fim de papo. Eu via as mulheres colocando seus bebês com pouco mais de 5 meses no berçário e retornando aos seus trabalhos e sentia frustração por não fazer o mesmo. Mas meus filhos eram diferentes, eles precisavam de cuidados que bebes “normais” não precisam, a rotina era mais difícil, e eram 2 né! Tudo o que eu não conseguiria encaixar na minha vida naquele momento seriam os estudos.

Minha salvação foi ter encontrado na esfera virtual grupos de apoio de maternidade consciente, que foi quando eu passei a ter contato com mulheres (várias se tornaram amigas na vida real também) que falavam de maternidade ativa, da maternidade fora da “matrix”, (de parto humanizado, criação com apego, alimentação saudável, e muitos outros assuntos), e descobri um novo mundo, o qual eu me encontrei perfeitamente como mãe e tudo o que antes estava solto na minha mente começou se encaixar. Antes, quando eu pensava sobre isso eu não sabia decifrar exatamente o porque estava pensando. Questionar as coisas como elas são dá um trabalho enorme e incomoda no início (principalmente quando o assunto é maternagem!!!), porque faz a gente sair da nossa zona de conforto e perceber como estamos acostumados a fazer tudo no “modo automático”, sem ao menos questionar se é o que consideramos correto ou não. Mas agora tudo fazia sentido. Foi aí que eu percebi que eu estava tendo uma grande chance, que algumas mulheres tanto queriam e não tinham, de  poder curtir cada momento da primeira infância dos meus filhos. Foi muito cansativo sim, alguns momentos chegava a beirar a loucura, mas foi maravilhoso poder vivenciar tudo o que aconteceu com eles nos primeiro ano de vida, fazer do meu jeito, seguir os meus instintos e principalmente o fato de poder resgatar o tempo que passaram na uti quando nasceram e fortalecer o nosso vínculo.

Com o tempo, várias coisas que antes eram importantes para mim, agora já não fazia mais sentido, e uma delas foi minha profissão. A maternidade  me mudou completamente, me fez enxergar quantas coisas nos dias de hoje estão erradas, como o mundo está perverso e como faz diferença na vida de uma criança ter a mãe por perto o máximo de tempo possível. Foi um caminho sem volta e sou muito grata por ter tido a oportunidade, mesmo que na época tenha sido imposta, de poder ter vivido e ainda viver intensamente a infância dos meus filhos da maneira como foi.

Hoje meus interesses são completamente diferentes dos que eu tinha aos 20 anos, não tenho um diploma, mas graças a tudo o que os meus filhos me ensinaram e apoio do marido e família, encerrarei esse ciclo da infância dos meus filhos feliz. Os meninos, agora com com 3 anos e 3 meses, ainda precisam de vários tratamentos de reabilitação e nossa rotina de terapias é diária, mas finalmente entramos numa fase que agora posso pensar novamente na minha vida profissional. Sinto muita alegria de olhar pra tráz e ver como amadureci, e muito alivio de poder dar outros rumos a minha carreira. Quem sabe até começar outra graduação..

Sem dúvidas, hoje eu seria muito infeliz se tivesse que fazer da vida o que eu escolhi aos 17 anos. Obrigada meus filhos.

Laura S. Moratti

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